quarta-feira, 13 de junho de 2007

sonambulismo,êxtase e dupla vista


RESUMO TEÓRICO DO SONAMBULISMO, DO ÊXTASE E DA DUPLA VISTA


455. Os fenómenos do sonambulismo natural se produzem espontaneamente e independentemente de qualquer causa exterior conhecida; mas, entre algumas pessoas, dotadas de organização especial, podem ser provocados artificialmente, pela acção do agente magnético.
O estado designado pelo nome de sonambulismo magnético não difere do sonambulismo natural, senão pelo facto de ser provocado, enquanto o outro é espontâneo.


O sonambulismo natural é um facto notório, que ninguém pensa pôr em dúvida, apesar do aspecto maravilhoso dos seus fenómenos. Que haveria pois, de mais extraordinário ou de mais irracional no sonambulismo magnético, por ser ele produzido artificialmente, como tantas outras coisas? Dizem que os charlatães o têm explorado; mais uma razão para que não seja deixado nas suas mãos. Quando a Ciência se tiver apropriado dele, o charlatanismo terá muito menos crédito entre as massas. Mas, enquanto se espera, como o sonambulismo natural ou artificial são um facto, e contra factos não há argumentos, ele se firma, apesar da má vontade de alguns, e isso no próprio seio da Ciência, onde penetra por uma infinidade de portas laterais, em vez de passar pela central. E, quando lá estiver plenamente firmado, será necessário lhe conceder o direito da cidadania.


Para o Espiritismo, o sonambulismo é mais do que um fenómeno fisiológico, é uma luz projectada sobre a Psicologia. É nele que se pode estudar a alma, porque é nele que ela se mostra a descoberto. Ora, um dos fenómenos pelos quais ela se caracteriza é o da clarividência, independente dos órgãos comuns da visão. Os que contestam o facto se fundam em que o sonâmbulo não vê sempre, e à vontade dos experimentadores, como através dos olhos. Seria de admirar que os meios sendo diferentes, os efeitos não sejam os mesmos? Seria racional buscar efeitos semelhantes, quando não existe o instrumento? A alma tem as suas propriedades, como os olhos têm a deles; é preciso julgá-los em si mesmos, e não por analogia.


A causa da clarividência do sonambulismo magnético e do sonambulismo natural são a mesma: um atributo da alma, uma faculdade inerente a todas as partes do ser incorpóreo que existe em nós, e que não tem limites além dos que são assinalados à própria alma. O sonâmbulo vê em toda parte a que sua alma possa transportar-se, qualquer que seja a distância.


No caso da visão à distância, o sonâmbulo não vê as coisas do lugar em que se encontra o seu corpo, à semelhança de um efeito telescópio. Ele as vê presentes, como se estivesse no lugar em que elas existem, porque a sua alma lá se encontra realmente; eis porque o seu corpo fica como aniquilado e privado de sensações, até o momento em que a alma se reapossar dele. Essa separação parcial da alma e do corpo é um estado anormal, que pode ter uma duração mais ou menos longa, mas não indefinida. Essa a causa da fadiga que o corpo experimenta, após um certo tempo, sobretudo quando a alma se entrega a um trabalho activo.


A vista da alma ou do Espírito não sendo circunscrita e não tendo sede determinada, isso explica porque os sonâmbulos não podem assinalar para ela um órgão especial; eles vêem porque vêem, sem saber por que nem como, pois a vista não tem, para eles, como Espíritos, lugar próprio. Se eles se reportam ao corpo, esse lugar parece estar nos centros em que a actividade vital é maior, principalmente no cérebro, ou na região epigástrica, ou no órgão que, para eles, é o ponto de ligação mais intenso entre o Espírito e o corpo.


O poder de lucidez sonambúlica não é indefinido. O Espírito, mesmo quando completamente livre, é limitado em suas faculdades e em seus conhecimentos, segundo o grau de perfeição que tenha atingido; e é mais ainda, quando ligado à matéria, da qual sofre a influência. Essa a causa por que a clarividência sonambúlica não é universal nem infalível. E tanto menos se pode contar com a sua infalibilidade, quanto mais a desviem do fim proposto pela natureza e a transformem em objecto de curiosidade e de experimentação.


No estado de desprendimento em que se encontra o Espírito do sonâmbulo, entra ele em comunicação mais fácil com os outros Espíritos, encarnados ou não. Essa comunicação se estabelece pelo contacto dos fluidos que compõem o perispírito e servem de transmissão ao pensamento, como o fio à electricidade. O sonâmbulo não tem, pois, necessidade de que o pensamento seja articulado através da palavra: ele o sente e adivinha; é isso que o torna eminentemente impressionável e acessível às influências da atmosfera moral em que se encontra. É também por isso que uma influência numerosa de espectadores, e sobretudo de curiosos mais ou menos malévolos, prejudica essencialmente o desenvolvimento de suas faculdades, que, por assim dizer, se fecham sobre si mesmas e não se desdobram com toda a liberdade, como na intimidade e num meio simpático. A presença de pessoas malévolas ou antipáticas produz sobre ele o efeito do contacto da mão sobre a sensitiva.


O sonâmbulo vê, ao mesmo tempo, o seu próprio Espírito e o seu corpo; eles são, por assim dizer, dois seres que lhe representam a dupla existência espiritual e corporal, confundidos, entretanto, pelos laços que os unem. Nem sempre o sonâmbulo se dá conta dessa situação, e essa dualidade faz que frequentemente ele fale de si mesmo como se falasse de uma pessoa estranha. É que num momento, o ser corporal fala ao espiritual, e noutro é o ser espiritual que fala ao ser corporal.


O Espírito adquire um acréscimo de conhecimentos e de experiências em cada uma de suas existências corpóreas. Esquece-os, em parte, durante a sua encarnação numa matéria demasiado grosseira, mas recorda-os como Espírito. É assim que certos sonâmbulos revelam conhecimentos superiores ao seu grau de instrução, e mesmo à sua capacidade intelectual aparente. A inferioridade intelectual e científica do sonâmbulo, em seu estado de vigília, não permite, portanto, prejulgar-se nada sobre os conhecimentos que ele pode revelar no estado lúcido. Segundo as circunstâncias e o objectivo que se tenha em vista, ele pode auri-los na sua própria experiência, na clarividência das coisas presentes, ou nos conselhos que recebe de outros Espíritos; mas, como o seu próprio Espírito pode ser mais ou menos adiantado, ele pode dizer coisas mais ou menos justas.


Pelos fenómenos do sonambulismo, seja natural, seja magnético, a Providência nos dá a prova irrecusável da existência e da independência da alma, e nos faz assistir ao espectáculo sublime da sua emancipação; por esses fenómenos, ela nos abre o livro do nosso destino. Quando o sonâmbulo descreve o que se passa à distância, é evidente que ele o vê, mas não pelos olhos do corpo: vê-se a si mesmo no local, e para lá se sente transportado; lá existe, portanto qualquer coisa dele, e essa qualquer coisa, não sendo o seu corpo, só pode ser a sua alma ou seu Espírito. Enquanto o homem se extravia nas subtilezas de uma metafísica abstracta e ininteligível, na busca das causas de nossa existência moral, Deus põe diariamente sob os seus olhos e sob as suas mãos os meios mais simples e mais patentes para o estudo da psicologia experimental.
O êxtase é o estado pelo qual a independência entre a alma e o corpo se manifesta da maneira mais sensível, e se torna, de certa forma, palpável.


No sonho e no sonambulismo a alma erra pelos mundos terrestres; no êxtase, ela penetra um mundo desconhecido, o dos Espíritos etéreos com os quais entra em comunicação, sem entretanto poder ultrapassar certos limites, que ela não poderia transpor sem romper inteiramente os laços que a ligam ao corpo. Um fulgor resplandecente e inteiramente novo a envolve, harmonias desconhecidas na Terra a empolgam, um bem-estar indefinível a penetra: ela goza, por antecipação, da beatitude celeste, e pode-se dizer que pousa um pé no limiar da eternidade.


No estado de êxtase o aniquilamento do corpo é quase completo; ele só conserva, por assim dizer, a vida orgânica. Sente-se que a alma não se liga a ele mais que por um fio, que um esforço a mais poderia romper seu remédio.


Nesse estado, todos os pensamentos terrenos desaparecem, para darem lugar ao sentimento puro que é a própria essência do nosso ser imaterial. Todo entregue a essa contemplação sublime, o extático não encara a vida senão como uma parada momentânea; para ele, os bens e os males, as alegrias grosseiras e as misérias deste mundo não são mais que fúteis incidentes de uma viagem da qual se sente feliz ao ver o termo.


Acontece com os extáticos o mesmo que com os sonâmbulos: sua lucidez pode ser mais ou menos perfeita, e seu próprio Espírito, conforme for mais ou menos elevado, é também mais ou menos apto a conhecer e a compreender as coisas. Verifica-se nele, às vezes, mais exaltação do que verdadeira lucidez, ou, melhor dito, sua exaltação prejudica a lucidez; é por isso que suas revelações são frequentemente uma mistura de verdades e erros, de coisas sublimes e de coisas absurdas, ou mesmo ridículas. Espíritos inferiores aproveitam-se muitas vezes dessa exaltação, que é sempre uma causa de fraqueza, quando não se sabe vencê-la, para dominar o extático, e para tanto se revestem aos seus olhos de aparências que o mantêm nas suas ideias preconceitos do estado de vigília. Este é um escolho, mas nem todos são assim; cabe-nos julgar friamente e pesar as suas revelações na balança da razão.


A emancipação da alma se manifesta às vezes no estado de vigília, e produz o fenómeno designado pelo nome de dupla vista, que dá aos que o possuem a faculdade de ver, ouvir e sentir além dos limites dos nossos sentidos. Eles percebem as coisas ausentes, por toda parte, até onde a alma possa estender a sua acção; vêem, por assim dizer, através da vista ordinária, como por uma espécie de miragem.


No momento em que se produz o fenómeno da dupla vista, o estado físico é sensivelmente modificado: os olhos têm qualquer coisa de vago, olhando sem ver, e toda a fisionomia reflecte uma espécie de exaltação. Constata-se que os órgãos da visão são alheios ao fenómeno, ao verificar-se que a visão persiste, mesmo com os olhos fechados.


Esta faculdade se afigura, aos que a possuem, tão natural como a de ver: consideram-na um atributo normal, que não lhes parece constituir excepção. O esquecimento se segue, em geral, a essa lucidez passageira, cuja lembrança se torna cada vez mais vaga, e acaba por desaparecer, como a de um sonho.


O poder da dupla vista varia desde a sensação confusa até à percepção clara e nítida das coisas presentes ou ausentes. No estado rudimentar, ela dá a algumas pessoas o tacto, a perspicácia, uma espécie de segurança nos seus actos, a que se pode chamar a justeza do golpe de vista moral. Mais desenvolvida, desperta os pressentimentos, e ainda mais desenvolvida, mostra acontecimentos já realizados ou em vias de realização.


O sonambulismo natural e artificial, o êxtase e a dupla vista, não são mais do que variedades ou modificações de uma mesma causa. Esses fenómenos da mesma maneira que os sonhos, pertencem à ordem natural. Eis por que existiram desde todos os tempos: a História nos mostra que eles foram conhecidos, e até mesmo explorados, desde a mais alta antiguidade, e neles se encontra a explicação de uma infinidade de factos que os preconceitos fizeram passar como sobrenaturais.


autor desconhecido

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