sábado, 16 de fevereiro de 2008

A visão de Deus


A visão de Deus

31. - Se Deus está em toda parte, por que não o vemos? Vê-lo-emos

quando deixarmos a Terra?

Tais as perguntas que se formulam todos os dias.
À primeira é fácil responder. Por serem limitadas as percepções dos nossos órgãos visuais, elas os tornam inaptos à visão de certas coisas, mesmo materiais. Alguns fluidos nos fogem totalmente à visão e aos instrumentos de análise; entretanto, não duvidamos da existência deles. Vemos os efeitos da peste, mas não vemos o fluido que a transporta (1); vemos os corpos em
movimento sob a influência da força de gravitação, mas não vemos essa força.

32. - Os nossos órgãos materiais não podem perceber as coisas de
essência espiritual. Unicamente com a visão espiritual é que podemos ver os
Espíritos e as coisas do mundo imaterial. Somente a nossa alma, portanto, pode
ter a percepção de Deus. Dar-se-á que ela o veja logo após a morte? A esse
respeito, só as comunicações de além-túmulo nos podem instruir. Por elas
sabemos que a visão de Deus constitui privilégio das mais purificadas almas e
que bem poucas, ao deixarem o envoltório terrestre, se encontram no grau de
desmaterialização necessária a tal efeito. Uma comparação vulgar o tornará
facilmente compreensível.

33. - Uma pessoa que se ache no fundo de um vale, envolvido por densa
bruma, não vê o Sol. Entretanto, pela luz difusa, percebe que está fazendo sol.
Se entra a subir a montanha, à medida que for ascendendo, o nevoeiro se irá
tornando mais claro, a luz cada vez mais viva. Contudo, ainda não verá o Sol.
Só depois que se haja elevado acima da camada brumosa e chegado a um
ponto onde o ar esteja perfeitamente límpido, ela o contemplará em todo o seu
esplendor.
O mesmo se dá com a alma. O envoltório perispirítico, conquanto nos
seja invisível e impalpável, é, com relação a ela, verdadeira matéria, ainda
grosseira demais para certas percepções. Ele, porém, se espiritualiza, à
proporção que a alma se eleva em moralidade. As imperfeições da alma são
quais camadas nevoentas que lhe obscurecem a visão. Cada imperfeição de
que ela se desfaz é uma mácula a menos; todavia, só depois de se haver
depurado completamente é que goza da plenitude das suas faculdades.

34. - Sendo Deus a essência divina por excelência, unicamente os
Espíritos que atingiram o mais alto grau de desmaterialização o podem
perceber. Pelo facto de não o verem, não se segue que os Espíritos imperfeitos
estejam mais distantes dele do que os outros; esses Espíritos, como os demais,
como todos os seres da Natureza, se encontram mergulhados no fluido divino,
do mesmo modo que nós o estamos na luz. O que há é que as imperfeições
daqueles Espíritos são vapores que os impedem de vê-lo. Quando o nevoeiro se
dissipar, vê-lo-ão resplandecer. Para isso, não lhes é preciso subir, nem
procurá-lo nas profundezas do infinito. Desimpedida a visão espiritual das
belidas que a obscureciam, eles o verão de todo lugar onde se achem, mesmo da Terra, porquanto Deus esta em toda parte.

35. - O Espírito só se depura com o tempo, sendo as diversas
encarnações o alambique em cujo fundo deixa de cada vez algumas impurezas.
Com o abandonar o seu invólucro corpóreo, os Espíritos não se despojam
instantaneamente de suas imperfeições, razão por que, depois da morte, não
vêem a Deus mais do que o viam quando vivos; mas, à medida que se
depuram, têm dele uma intuição mais clara. Não o vêem, mas compreendem-no
melhor; a luz é menos difusa. Quando, pois, alguns Espíritos dizem que Deus
lhes proíbe respondam a uma dada pergunta não é que Deus lhes apareça, ou
dirija a palavra, para lhes ordenar ou proibir isto ou aquilo, não; eles, porém, o
sentem; recebem os eflúvios do seu pensamento, como nos sucede com
relação aos Espíritos que nos envolvem em seus fluidos, embora não os
vejamos.

36. - Nenhum homem, consequentemente, pode ver a Deus com os olhos
da carne. Se essa graça fosse concedida a alguns, só o seria no estado de
êxtase, quando a alma se acha tão desprendida dos laços da matéria que torna
possível o facto durante a encarnação. Tal privilégio, aliás, exclusivamente
pertenceria a almas de eleição, encarnadas em missão, que não em expiação.
Mas, como os Espíritos da mais elevada categoria refulgem de ofuscante brilho,
pode dar-se que Espíritos menos elevados, encarnados ou desencarnados,
maravilhados com o esplendor de que aqueles se mostram cercados, suponham
estar vendo o próprio Deus. É como quem vê um ministro e o toma pelo seu
soberano.

37. - Sob que aparência se apresenta Deus aos que se tornaram dignos
de vê-lo? Será sob uma forma qualquer? Sob uma figura humana, ou como um
foco de esplendente luz? A linguagem humana é impotente para dizê-lo, porque
não existe para nós nenhum ponto de comparação capaz de nos facultar uma
ideia de tal coisa. Somos quais cegos de nascença a quem procurassem inutilmente fazer compreendessem o brilho do Sol. A nossa linguagem é limitada
pelas nossas necessidades e pelo círculo das nossas ideias; a dos selvagens
não poderia descrever as maravilhas da civilização; a dos povos mais civilizados
é extremamente pobre para descrever os esplendores dos céus, a nossa
inteligência muito restrita para os compreender e a nossa vista, por muito fraca,
ficaria deslumbrada.

(1) Nota da Editora: Kardec escreveu de acordo com os conhecimentos da época, antes
de 1894.
Referencia: A Génese

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